Última alteração: 2019-08-13
Resumo
Tendo como campo interseccional a memória, a historiografia e a obra fílmica, esta pesquisa aborda algumas discussões sobre o entendimento da produção de um longa-metragem como uma forma de documento histórico, bem como os critérios normatizadores que tem como base o endosso acadêmico da escrita histórica tradicional. Como instrumento de pesquisa, o recorte aqui escolhido foi o filme “Moça com brinco pérola”, do diretor Peter Webber produzido em 2003, com relação direta a obra pictórica de mesmo nome do pintor holandês Johannes Vermeer, de 1665.
Com base na pesquisa do historiador Timothy Brook, que, tendo como referência as obras do pintor acima citado, traça paralelos entre os processos colonizadores e de expansão holandesa com mudanças no comportamento social da época, foi possível destacar características estilísticas presentes no filme estudado, como por exemplo na cena em que um jantar é servido na residência do pintor e pode se perceber a utilização de porcelana chinesa, assim como nos quadros de Vermeer, um dos resultados da exploração mercantil entre Holanda e China no século XVII.
Uma problemática recorrente na produção de escrita histórica é a manutenção de um modelo fechado, tradicional, e de origem eurocêntrica. Passando pelo pressuposto que os moldes acadêmicos científicos balizam os conhecimentos, as memórias populares e os saberes outros ficam relegados a margear a história como um breve complemento, e nunca como protagonistas de si. A colonialidade do saber é um dos braços da manutenção do poder do patriarcado histórico, então como inscrever indícios outros que a “História” não quer contar?
O cinema, assim como a escrita histórica tradicional, faz uso de recortes para, a partir de um ponto de vista, narrar um retrato possível por meio de linguagem artística especifica. Não se tem como avaliar um filme nos mesmos modelos de análise de uma carta secular. Uma problemática intrínseca na produção fílmica com relação à narrativa histórica é a identificação do modelo documentário como única forma de dramaturgia e sempre sob a curadoria de um historiador renomado. Mas, percebeu-se ao longo desta pesquisa, que é possível por meio da narrativa metafórica, um caminho alternativo e eficaz na elaboração de documento histórico fílmico, com linguagens plurais, comovente e de entretenimento massivo.