Iniciação Científica (PIC) e Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação (PIBITI), II Encontro Anual de Iniciação Científica da Unespar

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A INTERSETORIALIDADE NAS POLÍTICAS PÚBLICAS: UMA PESQUISA BIBLIOGRÁFICA E DE CAMPO REALIZADA A PARTIR DO CUMPRIMENTO DE CONDICIONALIDADES DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA EM PARANAVAÍ/PR
Aline Lopes de Sousa

Última alteração: 2016-09-20

Resumo


Esta pesquisa encontra-se vinculado a proposta de Tempo Integral de Dedicação Exclusiva (TIDE) da orientadora. É oriunda das leituras e discussões realizadas durante as orientações do Projeto de Iniciação Científica (PIC/PIBIC), tornando-se objeto de pesquisa do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) da acadêmica em questão.

Considerando o objeto desta pesquisa “intersetorialidade e políticas públicas”, partimos do seguinte problema: como o município de Paranavaí tem se articulado intersetorialmente para ofertar serviços, sobretudo, na Assistência Social, Educação e Saúde que facilitem o cumprimento das condicionalidades para as famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família?

Partindo desse pressuposto, elencamos como objetivo geral: analisar o cumprimento de condicionalidades do Programa Bolsa Família a partir da lógica intersetorial das Políticas de Assistência Social, Educação e Saúde em Paranavaí/PR.

E como objetivos específicos: fomentar uma discussão sobre intersetorialidade e as políticas públicas; identificar a concepção de intersetorialidade para as Políticas de Assistência Social, Educação e Saúde, apontando as devidas semelhanças e distinções identificadas pela gestão municipal; caracterizar a configuração dos serviços municipais nas áreas de Assistência Social, Educação e Saúde na perspectiva da intersetorialidade.

Para a investigação do objeto de pesquisa adotar-se-á a técnica da triangulação que consiste na combinação de múltiplas metodologias qualitativas, envolvendo os diversos sujeitos sociais: gestores do Programa Bolsa Família, operadores do Cadastro Único e as famílias beneficiárias.

Quanto ao desenvolvimento da pesquisa qualitativa, em princípio foi feita a revisão bibliográfica e documental sobre intersetorialidade enquanto condição preliminar para o êxito do processo de cumprimento de condicionalidades do Programa Bolsa Família.

A partir desses estudos realizamos a pesquisa de campo. Para tanto, utilizamos para a coleta de dados a entrevista semiestruturada enquanto “técnica privilegiada de comunicação” (MINAYO, 2013, p. 64). Portanto, a pesquisa realizada é bibliográfica e de campo, de abordagem descritiva.

Na pesquisa empírica foram entrevistados 10 sujeitos, sendo eles: as coordenadoras responsáveis pelo acompanhamento das condicionalidades na área da Educação e Saúde; a gestora e a coordenadora do Cadastro Único e do Programa Bolsa Família na área da Assistência Social; 2 entrevistadores/operadores do Cadastro Único alocados no CRAS Maringá e CRAS Vila Operária; 2 famílias referenciadas no CRAS Maringá e 2 famílias do CRAS Vila Operária, considerando as famílias com maior e menor índice de reincidência no descumprimento de condicionalidades do Programa Bolsa Família. Os Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) a serem pesquisados foram escolhidos considerando os seguintes critérios: o território com maior índice de cumprimento de condicionalidades que corresponde ao CRAS Maringá; e um dos territórios com menor índice de cumprimento de condicionalidades no município que corresponde aos CRAS da Vila Operária, segundo informações do órgão gestor da Assistência Social de Paranavaí/PR e dados visualizados pelo Portal da Transparência[1].

Diante do exposto, buscar-se-á, por meio da pesquisa combinar a singularidade do município estudado com as tendências históricas, na perspectiva da universalidade, reconstruindo as particularidades do objeto de análise com o real.

 

A INTERSETORIALIDADE ENQUANTO UM DOS EIXOS ESTRUTURANTES DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA E SUA PERSPECTIVA NA ÁREA DA SAÚDE, EDUCAÇÃO E ASSISTÊNCIA SOCIAL

 

A intersetorialidade pode ser abordada como uma articulação entre as redes, sem desprezar suas singularidades, promovendo a partilha de experiências no sentido de contribuir, opinar e participar da construção efetiva de possibilidades de atender as demandas sociais da população vinculada também ao programa e suas condicionalidades.

Assim, podemos considerar a intersetorialidade, um dos eixos estruturantes do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) e forma preliminar no processo de cumprimento de condicionalidades do Programa Bolsa Família, na Assistência Social e nas demais políticas envolvidas: Saúde e Educação.

 

A intersetorialidade com as políticas universais de saúde e educação foi uma das características inovadoras do programa sugerindo fortemente a expansão da oferta de atenção em saúde e a permanência nas escolas públicas para um contingente populacional que muitas vezes encontrava dificuldade de acessar esses mesmos serviços (FONSECA; VIANA, 2014, p.64).

 

 

Neste sentido, a articulação que se desenvolve neste ambiente, onde as deliberações são tomadas no coletivo e são extraídas as orientações e propostas para ser efetivadas, “deve-se contar com mecanismos operacionais que favoreçam a implementação conectada das várias intervenções realizadas pelas diferentes políticas setoriais”, como destaca Bidarra (2009, p.486).

A intersetorialidade pode significar apenas um procedimento da reforma administrativa do Estado ou, a partir de uma perspectiva democrática, a possibilidade de partilha efetiva de poder. Considerando esta última, a gestão pública passa a exigir ações pactuadas, o desenvolvimento de capacidades institucionais e o estabelecimento de diálogo político entre os diferentes setores responsáveis pela implantação e implementação das políticas sociais.

 

A decisão pela ação intersetorial traduz a intervenção política de investir num processo socialmente construído, o qual requer o conhecimento da realidade e a análise das demandas explicitadas pelos sujeitos que partilham compromissos e projetos políticos comuns. (BIDARRA, 2009, p.485).

 

Nesta perspectiva da autora, espera-se que todas as redes se integrem em suas experiências, a partir da construção do conhecimento e ação coletiva. “E há, ainda, quem veja no exercício da intersetorialidade a possibilidade de substituição de necessidades por direitos” (PEREIRA, 2014, p.26).

Partindo desse pressuposto, identificamos a importância da intersetorialidade que acaba ganhando destaque no âmbito das políticas sociais. Esse contexto é percebido desde a década de 1990, ganhando centralidade na agenda social a partir da configuração de programas de transferência de renda.

 

No que se refere às iniciativas governamentais atuais em prol do desenvolvimento da intersetorialidade das políticas sociais, reconhece-se que o governo federal, através do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), tem investido na (re)construção da Política de Assistência Social com base na Política Nacional de Assistência Social (PNAS) e na formulação de programas com desenho intersetorial. Entretanto, é preciso reconhecer que é somente na IV Conferência Nacional de Assistência Social, realizada em dezembro de 2003, que se define uma nova agenda com diretrizes objetivas em relação à organização desta arena setorial, momento a partir do qual a intersetorialidade passa a ser tônica dos debates no campo da assistência social (MONNERAT; SOUZA, 2014, p. 44).

 

 

A partir da promulgação da PNAS, em 2004, há uma mudança de paradigma na assistência social, “e para efeito da operacionalização do Sistema Único de Assistência Social (SUAS)[2], está previsto que as ações no campo da assistência social devem ocorrer em sintonia e articulação com outras políticas públicas” (BRASIL, 2004 apud MONNERAT; SOUZA, 2014, p. 45).

Desta forma, a intersetorialidade se coloca como um elemento fundamental para a garantia dos direitos. Assim, a necessidade de se pensar em protocolos e fluxos de atendimentos para atender as famílias beneficiárias de forma conjunta e efetiva. Neste modelo de gestão, torna-se necessário então buscar parcerias intersetoriais com atuações inovadoras para atender tais necessidades.

Pensando o Programa Bolsa Família a partir da perspectiva intersetorial, temos outras políticas sociais envolvidas no processo de gestão e execução do programa, além da Assistência Social. Na saúde, podemos salientar que, antes da Constituição Federal de 1988, a saúde coletiva era entendida apenas no aspecto da doença e não propunha uma ação proativa.  A discussão sobre a intersetorialidade na saúde vem se contrapor a esta perspectiva.

Nestas circunstâncias, compreendendo que este processo de saúde não pode ser mais visto dessa maneira para atender as necessidades da população em sua totalidade, começa-se a configurar uma nova forma de pensar a saúde coletiva: “como uma estratégia fundamental para atuar sobre problemas estruturais da sociedade e que incidem sobre o processo saúde-doença” (MONNERAT; SOUZA, 2014, p. 43).

 

Na saúde coletiva, o debate da intersetorialidade nasce mediado pelo conceito ampliado de saúde conformado a partir do projeto da reforma sanitária, perspectiva na qual se reconhece que os determinantes sociais, e não somente os aspectos biológicos, incidem sobre o processo saúde – doença. A própria diretriz da promoção da saúde, uma das dimensões interventivas do SUS, implica necessariamente no estabelecimento de agendas públicas com a participação de diversos atores/setores para se alcançar mais saúde e uma melhor qualidade de vida (CAMPOS, 2003 apud MONNERAT; SOUZA, 2014, p.42-43).

 

 

A intersetorialidade, neste processo, assume tal importância, que a “Organização Mundial de Saúde (OMS), compreende a intersetorialidade como uma articulação de ações de vários setores para alcançar melhores resultados de saúde” (MONNERAT; SOUZA, 2014, p.43).

Ainda nesta linha de raciocínio, a intersetorialidade abrange outras áreas, uma delas a da Educação. De acordo com Monnerat e Souza (2014, p.46) “dentre as principais políticas públicas de corte social, é a que apresenta menor quantidade de produção bibliográfica sobre o tema da intersetorialidade”. Esse dado representa uma contradição, por ser uma área que afeta diretamente as famílias. Percebe-se que o nível de vulnerabilidade social traduz diretamente no aprendizado das crianças e adolescentes, como: “evasão escolar, altas taxas de analfabetismo, disparidade na relação idade e série, baixos índices de escolaridade” (MONNERAT; SOUZA, 2014, p. 47). Portanto, onde há a presença de indicadores mais negativos, há mais dificuldade no processo de ensino e aprendizagem.

Contudo, para entender melhor essa ligação e buscar formas de enfrentamento é preciso desenvolver um trabalho intersetorial, como propõe o Programa Bolsa Família.

 

O desenho do PBF é fortemente pautado na intersetorialidade. Vale dizer que até hoje nenhum outro programa social foi tão dependente da articulação intersetorial e, portanto, das capacidades institucionais e de diálogo político entre os entes da federação e os diferentes setores responsáveis pelo desenvolvimento das políticas sociais e públicas (MONNERAT; SOUZA, 2014, p. 45).

 

Diante do exposto, vale salientar a necessidade de aprofundar essa abordagem uma vez que o PBF exige uma articulação intersetorial para promover o acesso à educação, à saúde e a outros serviços básicos de modo descentralizado, a partir do controle do Índice de Gestão Descentralizada (IGD)[3]. Silva (2014) ressalta que o processo é iniciado com a assinatura de Termo de Adesão pelo qual o município compromete-se a instituir comitê ou conselho local de controle social e a indicar o gestor municipal do Programa. Para efetivação do processo de implementação, são previstas responsabilidades partilhadas entre a União, Estados, municípios e a sociedade, principalmente no acompanhamento das condicionalidades.

Portanto, as condicionalidades são de responsabilidade do MDS em articulação com os Ministérios de Educação e Saúde por meio de repasse de informações e prestações de contas via sistemas específicos[4], com registros regulares e cumprimento de calendários fixados previamente.

Essa responsabilidade em manter o benefício também é estendida para as famílias que assumem compromissos junto ao poder público:

 

As famílias beneficiárias do Bolsa Família têm liberdade na aplicação do benefício monetário recebido, podendo permanecer no Programa enquanto atendam aos critérios de elegibilidade e cumpram as condicionalidades, na Educação: matrícula de crianças e adolescentes de 6 a 17 anos na escola; frequência regular mínima de 85% das aulas para as crianças de 6 a 15 anos e de 75% para jovens de 16 a 17 anos; na Saúde: frequência de crianças de 0 a 7 anos de idade aos postos de saúde para vacinação, pesar, medir e fazer exames de proteção básica à saúde, incluindo também a frequência de mulheres gestantes aos exames de rotina; na Assistência Social: as crianças e adolescentes de até 16 anos, em situação de risco ou retirados do trabalho infantil pelo PETI, devem ter uma frequência mínima de carga horária mensal de 85% aos Serviços de Convivência e Fortalecimentos de Vínculos (SCFV). Essas condicionalidades são consideradas pelo MDS compromissos atribuídos às famílias beneficiárias para o recebimento do benefício financeiro do Programa, igualmente são considerados compromissos do poder público, responsável pela oferta dos serviços públicos de saúde, educação e assistência social. (SILVA, 2014, p.170).

 

O descumprimento de condicionalidades é fixado pela Portaria GM/MDS nº 321 de setembro de 2008 que perpassa pela advertência escrita, bloqueio do benefício por 30 dias, suspensão por 60 dias e o cancelamento do benefício.

Quando as famílias descumprem essas condicionalidades, a mesma Portaria prevê que haja advertência, no primeiro registro, e a partir da segunda ocorrência as famílias ficam sujeitas as seguintes sanções: bloqueio do benefício por um mês, no segundo registro de descumprimento; a partir da terceira suspensão; e se tiver novos efeitos no benefício por descumprimento há o cancelamento do benefício após o registro no Sistema de Condicionalidades do Programa Bolsa Família (SICON).

Nesse processo, podemos identificar certa culpabilização das famílias que não conseguem cumprir as condicionalidades. Silva (2014, p. 173) alerta que, nesse processo, “[...] não é considerado a possibilidade da inexistência ou da precariedade dos serviços ofertados, não sendo o Estado responsabilizado ou punido pela omissão na prestação inclusive dos serviços básicos para a população [...]”.

Ressalta-se que o cumprimento de condicionalidades requer um esforço coletivo e não apenas das famílias beneficiárias no processo de superação das vulnerabilidades. Para melhor entender essa afirmativa selecionamos duas famílias que cumprem regularmente as condicionalidades e outras duas que apresentam dificuldades em cumpri-las para participarem da pesquisa empírica. Resumidamente:

•           As primeiras famílias entrevistadas justificam ter facilidade em cumprir as condicionalidades, sobretudo na área da saúde, em decorrência do acesso aos serviços públicos, como a Unidade Básica de Saúde: “porque o postinho fica perto” (FAMÍLIA 2).

•           Estas últimas justificam a dificuldade de manter os filhos adolescentes na escola, apresentando baixo índice de frequência escolar, conforme exigido pelas condicionalidades da educação. Os adolescentes se sentem desestimulados o que implica no questionamento da qualidade do ensino na atualidade.

Na sequência, elencamos o perfil dos sujeitos entrevistados.

 

Tabela 1

Perfil das famílias entrevistadas

Identificação

FAMILIA 1

FAMILIA 2

FAMILIA 3

FAMILIA 4

Faixa etária

44 anos

24 anos

38 anos

49 anos

Estado civil

Divorciada

Em união estável sem documentação

Solteira

Casada

Ocupação

Diarista

Do lar

Serviços Gerais

Do lar

Fonte: Elaborado pelas autoras (2016)

 

Na família 1 a mãe é divorciada, portanto chefe da família. Ela tem dois filhos com faixa etária entre 16 e 17 anos de idade, um dos filhos estuda em sala especial, recebe R$ 161,00 de PBF e trabalha como diarista. A mesma recebe pensão do ex-marido para poder pagar o aluguel de R$ 380,00. Ressalta-se que a família tinha adquirido uma casa pelo Programa Minha Casa Minha Vida, mas eles não se adaptaram no lugar em que se localizava a nova residência e abandonaram o local voltando para o antigo bairro que morava.

A família 2 é composta pela a mãe, o pai e três filhos. Os filhos apresentam idades de 3 a 7 anos, só uma das crianças está estudando. O pai está desempregado recebendo seguro desemprego no valor de R$ 850,00, a mãe também não trabalha, pois verbaliza que precisa cuidar das crianças. A família mora em casa própria adquirida Programa Minha Casa Minha Vida. Recebe R$ 298,00 de PBF, a única renda fixa da família no momento.

A família 3 é composta pela mãe e três filhos. Os filhos têm de 6 a 12 anos, e todos estudam, mas apresentam índice de falta expressivo na escola. A filha verbaliza que “não gosto de estudar”. A família mora em casa própria adquirida pelo Programa Minha Casa Minha Vida. A mãe trabalha numa pizzaria a noite como serviço geral recebe por diária. Além disso, ela recebe mensalmente a pensão dos filhos no valor de R$ 325,00 mais o PBF que corresponde a R$ 310,00 por mês.

A família 4 é composta por mãe, pai e 3 filhos. Uma filha, de 21 anos, concluiu o Ensino Médio e atualmente trabalha como cuidadora de idoso, recebe um salário mínimo mensal. A mesma não é registrada, pois a mãe tem medo de perder o benefício. Outro filho estuda na modalidade de Educação de Jovens e Adultos (CEEBJA) e tem 19 anos; outro cursa o 8º ano do Ensino Fundamental, ele tem 17 anos e recebe Benefício de Prestação Continuada (BPC). O pai trabalha na informalidade na condição de pedreiro, “o mesmo não ajuda a pagar as despesas domésticas”, afirma a esposa dele. A família mora em casa cedida, é herança da família do esposo. Ressalta-se que essa família também foi contemplada pelo programa de habitação, porém não aceitaram mudar de bairro, recusando a nova residência. Eles recebem R$ 119,00 do PBF.

No que se refere a composição familiar, identificamos que das quatro famílias entrevistadas apenas uma tem como chefe da família o companheiro, contudo o mesmo trabalha na informalidade. As famílias beneficiárias apresentam dificuldades em se inserir no mercado de trabalho formal em decorrência qualificação profissional precária, sendo assim os responsáveis pelas famílias ficam à mercê do mercado de trabalho informal, passando o PBF a ser a principal fonte de renda dessas famílias.

Em síntese são famílias chefiadas por mulheres, mesmo quando há a presença da figura masculina na composição familiar, estes não contribuem economicamente para a dinâmica doméstica. A família normalmente não apresenta renda fixa e vínculo empregatício estável. Sobrevivem da informalidade para manutenção do benefício. O acesso aos serviços sociais existe, como aos programas de habitação, porém são frágeis e precisam ser revistos pensando na territorialidade, pois não atendem as necessidades das famílias contemporâneas.

Também entrevistamos as gestoras do Programa Bolsa Família no município pesquisado que apresentam formações distintas na área da saúde, social e administração, portanto de ensino superior. A partir dos dados expostos, pode-se perceber que todas as entrevistadas são mulheres maduras com idades variadas, assim como o tempo de profissão.

Tabela 2

 

Perfil das gestoras entrevistadas

Identificação

GESTORA

1

GESTORA

2

GESTORA

3

GESTORA

4

Faixa etária

56 anos

29 anos

40 anos

54 anos

Profissão

Assistente Social

Enfermeira

Administradora

Assistente Social

Tempo de Profissão

25 anos

10 anos na mesma área

4 anos

9 anos

10 anos

7 anos e meio no mesmo cargo

Fonte: Elaborada pelas autoras (2016)

 

A gestão precisa criar estratégias que facilitem o cumprimento das condicionalidades e observar as condições concretas. Para exemplificar, a Gestora 1, cita as Unidades Básicas de Saúde, Escolas, Centro de Referências de Assistência Social que devem ser próximas as residências das famílias beneficiárias pelo PBF; e se distante, pensar no acesso a meios de transportes públicos, dentre outras diversas ações de natureza intersetorial.

A possibilidade de isentar os beneficiários inadimplentes somente é considerada em casos que se comprovem que o descumprimento não dependeu deles, o que dificilmente acontece. A perspectiva da gestão torna-se punitiva e fiscalizatória e não de promoção dessas famílias.

Por fim, levantamos o perfil das operadoras do Cadastro Único e do Programa Bolsa Família em dois Centros de Referência de Assistência Social de Paranavaí/PR: CRAS Jardim Maringá e CRAS Vila Operaria, conforme tabela a seguir.

Tabela 3

Perfil das operadoras dos CRAS

Identificação

CRAS 1

CRAS 2

Faixa etária

35 anos

Não informou

Profissão ou ocupação

Agente Administrativo

Assistente Social

Tempo de profissão

8 meses

6 anos

Fonte: Elaborada pelas autoras (2016)

 

 

As entrevistadas trabalham nos CRAS elencados, também são mulheres com formação diferenciada, de ensino médio e superior, bem como recente tempo de profissão ou no exercício da função/cargo.

Identificamos ainda, nesta pesquisa, o entendimento das condicionalidades como “compromisso” e não como “obrigação”, partindo “da perspectiva de direitos e deveres”, afirma a operadora do CRAS 2 e complementa a operadora do CRAS 1 que “esses compromissos são assumidos pelas famílias e poder público”, portanto constituindo-se um compromisso de ambos.

A intersetorialidade é um desafio considerando a história das políticas públicas marcada pela intervenção fragmentada do Estado.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

O Programa Bolsa Família é resultado da unificação dos programas de transferência de renda que já existentes nos governos anteriores. Com esta unificação, podem-se propor melhorias na execução do PBF que busca ampliar seu público alvo e, consequentemente, o acesso das famílias em situação de vulnerabilidade socioeconômica ao programa, buscando respeitar o princípio da universalidade. Um dos eixos fundamentais do programa refere-se às condicionalidades envolvendo basicamente as políticas de assistência social, saúde e educação, entendendo a importância dessas políticas públicas na busca de parcerias intersetoriais.

A intersetorialidade é uma das dimensões centrais no âmbito do Programa Bolsa Família, no entanto as reflexões acerca deste eixo estruturante das políticas públicas compromissadas com uma gestão integrada de ações descentralizadas e participativas merecem ser aprofundadas uma vez que o PBF exige uma articulação intersetorial para promover o acesso à educação, à saúde e a outros serviços básicos, partindo do pressuposto que é de responsabilidade do Estado disponibilizar serviços públicos e de qualidade para todos os cidadãos, superando a perspectiva da culpabilização das famílias beneficiárias.

Na pesquisa em questão o tema intersetorialidade gerou polêmicas e contradições conceituais e de gestão entre Assistência Social, Saúde e Educação. Neste prisma, a intersetorialidade pode significar apenas um procedimento da reforma administrativa do Estado ou, em contrapartida e a partir de uma perspectiva democrática, a possibilidade de partilha efetiva de poder. Considerando esta última, a gestão pública passa a exigir ações pactuadas, o desenvolvimento de capacidades institucionais e o estabelecimento de diálogo político entre os diferentes setores responsáveis pela implantação e implementação das políticas sociais, dentre elas o PBF.

Neste sentido, o município pesquisado apresentou dificuldades em dar respostas às necessidades da população demandatária, e agora essa dificuldade é acirrada pela capacidade incipiente dos municípios em assumir os novos papeis que lhe são atribuídos no processo gerencial. Por exemplo, em Paranavaí não há um diálogo constante entre as três políticas sociais envolvidas na execução do PBF. Elas se comunicam apenas em situações de difícil resolutividade, isto é, em momentos esporádicos e pontuais. Ainda não organizaram ações conjuntas, pensando no fluxo de atendimento e estabelecimentos de protocolos para situações que envolvam o descumprimento de condicionalidades, a partir do âmbito de planejamento, monitoramento e avaliação.

Rever essa conduta implica na superação do trabalho em rede a partir de uma função fiscalizatória e tecnocrática. Implica ainda superar práticas e estruturas tradicionais, endógenas, patrimonialistas e corporativistas.

Diante do exposto, vale salientar a necessidade de aprofundar essa abordagem uma vez que o PBF exige uma articulação intersetorial para promover o acesso à educação, à saúde e a outros serviços básicos, também entender que o cumprimento das condicionalidades parte de obrigações assumidas e compartilhadas pelas famílias beneficiárias e Poder Público.

 

REFERÊNCIAS

BIDARRA, Zelimar Soares. Pactuar a intersetorialidade e tramar as redes para consolidar o sistema de garantia dos direitos. In: Serviço Social & Sociedade. n.99. São Paulo: Cortez, jul/set 2009.

 

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 1991.

 

BRASIL. Ministério de Desenvolvimento e Combate à Fome- MDS. Portal da Transparência. Disponível em                                                                                 <http://transparencia.gov.br/PortalTransparenciaPesquisaAcaoUF.asp?codigoAcao=8442&codigoFuncao=08&NomeAcao=Transfer%EAncia+de+Renda+Diretamente+%E0s+Fam%EDlias+em+Condi%E7%E3o+de+Pobreza+e+Extrema+Pobreza+%28Lei+n%BA+10%2E836%2C+de+2004%29&Exercicio=2015> Acesso em 24 de julho. 2016 as 21:41.

 

FONSECA, Ana; VIANA, Ana Luiza d´ Ávila. Política Social, Intersetorialidade e Desenvolvimento. In: ALMEIDA, Ney Luiz Teixeira de; SOUZA, Rosimary Gonçalves de (Orgs). A Intersetorialidade na Agenda das Políticas Sociais. Campinas, SP: Papel Social, 2014.

 

MINAYO, Maria Cecília de Souza. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 13. ed. São Paulo: Hucitec; Rio de Janeiro: Abrasco, 2013.

 

MONNERAT, Giselle Lavinas; SOUZA, Rosemary Gonçalves. Intersetorialidade e Políticas Sociais: um diálogo com a literatura atual. ALMEIDA, Ney Luiz Teixeira de; SOUZA, Rosimary Gonçalves de (Orgs). A Intersetorialidade na Agenda das Políticas Sociais. Campinas, SP: Papel Social, 2014.

 

PEREIRA, Potyara A. P.. A Intersetorialidade das Políticas Sociais na Perspectiva Dialética. In: ALMEIDA, Ney Luiz Teixeira de; SOUZA, Rosimary Gonçalves de (Orgs). A Intersetorialidade na Agenda das Políticas Sociais. Campinas, SP: Papel Social, 2014.

SILVA, Maria Ozanira da Silva.[et al.]; 2.ed. O Bolsa Família no enfrentamento à pobreza no Maranhão e Piauí. São Paulo: Cortez; Teresina: Editora Gráfica da UFPI, 2013.

­­­­­­­­­­_______. O Bolsa Família: Intersetorialidade – dimensão central na implementação e nos resultados do programa. In: ALMEIDA, Ney Luiz Teixeira de; SOUZA, Rosimary Gonçalves de (Orgs). A Intersetorialidade na Agenda das Políticas Sociais. Campinas, SP: Papel Social, 2014.

 


[1] Mais informações acessar: http://transparencia.gov.br/

[2] Conforme a Lei nº 12.435/2011, o SUAS é o gestor das ações da área de assistência social organizado sob a forma de sistema descentralizado e participativo, dominado Sistema Único de Assistência Social. Por intermédio dessa Lei, o SUAS é incorporado a Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS (Lei nº 8.742/1993), deixando de ser uma política de governo para ser uma política de Estado (BRASIL, 2011).

 

[3] Índice de Gestão Descentralizada, conhecido como IGD, é o indicador que mostra a qualidade da gestão descentralizada do PBF, considerando as três instâncias federativas. Portanto, o IGD tem como objetivo principal medir a qualidade da gestão municipal e do Cadastro Único, constituindo-se também numa forma de controle sobre o cumprimento das condicionalidades do programa no âmbito da Assistência Social, Saúde e Educação (SILVA, 2014).

 

[4] O sistema de descumprimento de condicionalidades na Educação denomina-se Projeto Presença On-line que deve ser preenchido bimestralmente. Na Saúde, o registro é feito no Sistema de Condicionalidades do Programa Bolsa Família (SICON).


Palavras-chave


Programa Bolsa Família. Condicionalidades. Intersetorialidade

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